quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Martírio

O horizonte azul no final da rua era apenas uma ilusão. Caminhando um pouco mais e vista por outro ângulo, percebe-se que é uma parede pintada  de azul que os moradores do lugar preferem acreditar que substitui o céu.As mulheres que tamborilam futilmente a direção de seus carros fortes falando inutilidades ao celular, são as mesmas que vão ao Mon Petit fazer 10 sessões de lipocavucação e que são as mesmas cujas filhas desfilam suas bundas para olhos armados dos homens dos carros fortes que ficam em pé com mãos na cintura.
Olhando pra trás vê-se Martírio da igreja feia, olhando pra frente vê-se Martirio dos perfumes artificiais que não conseguem disfarçar o cheiro podre que exala do preconceito.
Dizem que Martirio acabará em tragédia. Isso não sei. Só sei que quem a vê como realmente é foge e não volta nunca mais.
mirtes
Levante  nas Ruas Jaguaribe e Veiga Filho até o Shopping

5 comentários:

  1. Não há linha reta neste lugar. Por mais que se vá em linha reta de um ponto a outro. O caminhar sempre curva. Os moradores dali não sabem o quão curvos são os passos que se esforçam para dar em uma linha reta. As curvas são perigosas e embaçam a noção de infinito que os passantes dali querem enxergar. No lugar do infinito e da reta boa enxerga-se portas que desconvidam, árvores tristes apesar de velhas, faixas pintadas no chão e lajotas com a pretensão de refletir no chão o que ostentam os seis andares, as carruagens prata-escuro, os anjos com cornetas que servem de fonte aos pombos. Não há linha reta neste lugar. Por mais que se vá em linha reta de um ponto a outro. O caminhar sempre curva.

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  2. Caminhando alguns passos após o portal do silêncio um homem com um chapéu feito de nuvens e pés enormes lhe dará as boas vindas à Ardósia. Cidade de pedra que esconde suas últimas árvores no topo dos aranhas-céus, nas se sabe se para protegê-las ou se para tentar captar algum sinal ou estabelecer algum contato. Ao virar uma de suas esquinas o visitante pode ser surpreendido por uma janela de vento, vindo da Igreja Amarela. Dizem que esse sopro gelado é o vestígio do pedido de socorro das mulheres que ali foram aprisionadas, torturadas e queimadas.
    As esquinas de Ardósia são povoadas por seres misteriosos. Criaturas que habitam o chão e que tem o dom de ouvir o pensamentos de todos os passantes. Mulheres com olhos de vidro que refletem o medo e a angustia não só delas, mas das mulheres que elas foram em outras vidas. Vendedores invisíveis de especiarias, flores, frutas e ilusões. Recomenda-se não tocar na mão desses vendedores, pois esse sutil toque pode te despertar idéias e desejos transgressores.
    O castelo dos espelhos é cercado por guardas, cavalos, chaminés e hienas. Não caminhe lentamente no pátio do castelo, pois você pode ser considerado suspeito. Geralmente os moradores das redondezas que conseguem adentrar o Castelo, fantasiam-se de bichos (cobra, pavão, onça, zebra...), caminham rápido, compram algo e correm para suas casas. Se quiser vislumbrar a tragédia envernizada dos nobres e falsos nobres, duas recomendações: opte pela fantasia de um bicho europeu e cuidado com a sedução do consumo e da velocidade.

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  3. 11h:30 do 14 de novembro de 2011
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    Sete pessoas saindo de uma casa na Martim Francisco.
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    Sete pessoas com andar suspeito caminhando em silêncio pelas ruas Jaguaribe e Veiga Filho... 
    Quatro mulheres e três homens sobre o meio dia, andavam devagar observando tudo o que estava ao seu redor. Estudantes, hippies, caloteiros, malandros, ufólogos ou simplesmente românticos arcaicos, ninguém soube.
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    Rostros pálidos e sérios , andar corcovado, roupas escuras, frio, pressa, trabalho, estudo, compras... Dor de cabeça? Consulta no medico? Atraso para o almoço? Encontro com o namorado?
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    Um casal de velhos se segurando, um cuidando do outro, de olhares calmos e reflexivos caminhavam  pela rua Veiga Filho..
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    Chegada ao shopping Higienópolis: bufões, pavões, gavieros, aspiradores de fumaça , emissores de sons, guardiãs de tesouros, espectadores de histórias...

    Cada um tão importante e único quanto ou outro, tinha uma missão, uma tarefa por realizar dentro do grande collage de vivencias na cidade de São Paulo do 14 de novembro de 2011.

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  4. Primeiro a gente silencia, depois a gente sai pelo bairro de sempre e ai a gente (essa gente!) descobre que ele não é mais o bairro de sempre.
    Passos lentos, homens de chapéu, árvores verdes que resistem na selva de pedra.
    Anjos tocam trombeta no alto da igreja, ningúem ouve, ninguém vê. Ninguém???
    Alguns passantes lentos e desapressados - a quem diga que essa gente é um bando - levantam seus corpos cotidianos e seus olhares contaminados e cansados, e passam a ver o invisível. O tempo, o espaço, a cidade, as lacunas...
    Olham...e por olharem são vistos, reconhecidos, debochados. Não sabemos de onde vieram e para onde vão, mas sentimos sua presença.
    O bairro não é mais o mesmo e o bando (essa gente) também não!

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